A Arquitetura Africana: Herança Ancestral, Identidade Cultural e Práticas Sustentáveis
A arquitetura africana é uma das expressões mais ricas e diversificadas da criatividade humana. Muito além das representações generalistas, a arquitetura no continente africano revela soluções engenhosas desenvolvidas ao longo de milênios para responder aos desafios ambientais, sociais, espirituais e simbólicos de seus povos. Este artigo busca apresentar uma visão ampla da arquitetura africana — do legado tradicional às manifestações contemporâneas — destacando sua importância histórica, técnica e cultural.
Yasmin Wonstaen
6/10/20255 min ler


1. Introdução à Diversidade Arquitetônica Africana
A África é o segundo maior continente do mundo, com mais de 30 milhões de km² e aproximadamente 1,4 bilhão de habitantes, distribuídos entre mais de 50 países e milhares de grupos étnicos. Essa diversidade se reflete de forma direta na arquitetura.
A produção arquitetônica africana não pode ser compreendida como um fenômeno homogêneo. Pelo contrário, ela varia enormemente de acordo com o clima (desértico, tropical, equatorial, mediterrâneo, montanhoso), a geografia, os materiais disponíveis, as tradições culturais e religiosas, e os sistemas políticos de cada região.
2. Arquitetura Vernacular Africana: Sabedoria Popular e Técnicas Locais
A arquitetura vernacular africana, isto é, aquela desenvolvida pelas comunidades com base em seus conhecimentos transmitidos oralmente, é marcada pela harmonia com o meio ambiente.
Materiais e Técnicas
Os materiais utilizados nas construções vernaculares africanas são, em sua maioria, naturais e locais:
Barro e adobe: amplamente utilizados no Sahel e em regiões semiáridas.
Madeira: comum em áreas florestais, como na África Central.
Capim e palha: usados para coberturas em estruturas leves.
Pedra: presente em civilizações antigas como Axum (Etiópia) e Grande Zimbábue.
A construção é frequentemente um processo comunitário, onde membros da aldeia participam da edificação de casas, celeiros, locais sagrados e espaços públicos. As técnicas empregadas variam, mas compartilham a lógica da circularidade, da ventilação natural, do sombreamento e do uso eficiente de recursos.
Tipologias e Exemplos
Mesquitas de terra crua: A Mesquita de Djenné (Mali) é o maior edifício de adobe do mundo, sendo patrimônio mundial da UNESCO.
Cabanas Zulu (África do Sul): com estrutura circular e cobertura cônica em palha.
Casas Dogon (Mali): construídas em penhascos, com elementos defensivos e espirituais.
Habitações de palafita: encontradas em regiões alagadiças como as margens do Lago Nokoué (Benin).
3. Arquitetura como Reflexo do Sagrado
Na tradição africana, o espaço construído não é apenas funcional. Ele está carregado de significados simbólicos, espirituais e cosmológicos. Muitas aldeias são organizadas segundo princípios cosmológicos que refletem a relação com os ancestrais, os espíritos e a natureza.
O assentamento, a posição das portas, a direção dos edifícios e até os materiais escolhidos obedecem a regras culturais profundas, muitas vezes ligadas à religião, à astrologia ou à tradição oral do grupo.
Um exemplo é o povo Kassena (Burkina Faso), cujas casas são decoradas com desenhos geométricos que expressam proteção espiritual, fertilidade e conexão com o passado.
4. Arquitetura Monumental e Civilizações Antigas
Etiópia
Na Etiópia, a cidade de Lalibela abriga igrejas escavadas diretamente na rocha durante o século XII. Essas igrejas monolíticas são verdadeiras obras-primas de engenharia e espiritualidade cristã ortodoxa.
Grande Zimbábue
O Reino do Zimbábue (séculos XI a XV) deixou como legado as ruínas de Grande Zimbábue, com complexos murados de pedra seca que evidenciam o domínio da engenharia, do urbanismo e do comércio regional e intercontinental.
Egito Antigo
Embora geralmente não incluído na narrativa da “África subsaariana”, o Egito é parte integral da África. Suas pirâmides, templos e cidades demonstram o grau de sofisticação alcançado por civilizações africanas na Antiguidade.
5. Arquitetura Africana Contemporânea: Entre Tradição e Inovação
O século XXI tem testemunhado o ressurgimento do interesse por práticas arquitetônicas africanas que dialogam com a sustentabilidade, a identidade e a inclusão social.
Francis Kéré
Francis Kéré, arquiteto burquinense e ganhador do Prêmio Pritzker 2022, é um dos nomes mais influentes da arquitetura africana contemporânea. Em sua obra, ele incorpora materiais locais, participação comunitária e inovação formal. Sua Escola de Gando, construída com técnicas tradicionais adaptadas à ventilação natural, tornou-se referência mundial em arquitetura sustentável.
Diébédo Francis Kéré, David Adjaye, Mariam Kamara e Outros
Outros nomes que merecem destaque incluem:
David Adjaye (Gana/Reino Unido): autor do Museu Nacional de História e Cultura Afro-Americana (Washington, D.C.).
Mariam Kamara (Níger): desenvolve projetos comunitários que valorizam as práticas locais.
Mphethi Morojele (África do Sul): com foco em arquitetura urbana e identidade pós-apartheid.
6. Desafios e Oportunidades
A arquitetura africana contemporânea enfrenta desafios importantes:
Urbanização acelerada e desordenada.
Pressões coloniais e neocoloniais sobre os modos de construir.
Desvalorização das práticas tradicionais frente aos modelos ocidentais.
Por outro lado, há oportunidades significativas:
Resgate da arquitetura vernacular como modelo sustentável.
Empoderamento de comunidades através de projetos participativos.
Produção arquitetônica com identidade cultural forte, expressando orgulho e resistência.
7. Conclusão
A arquitetura africana é, acima de tudo, um campo de expressão múltipla, onde o fazer arquitetônico está entrelaçado com o viver, o espiritual, o simbólico e o coletivo. Ao estudá-la, resgatamos a dignidade de saberes historicamente silenciados, e abrimos espaço para outras formas de pensar o espaço, o corpo e a vida em comunidade.
Mais do que olhar para a África como um repositório do passado, é hora de reconhecê-la como fonte ativa de inovação, criatividade e soluções para os desafios contemporâneos da arquitetura e do urbanismo.
Fonte:
https://www.archdaily.com.br/br/879449/conheca-a-arquitetura-contemporanea-africana-alem-dos-esteriotipos
https://hypescience.com/45-belos-exemplos-de-arquitetura-africana/
https://casacor.abril.com.br/pt-BR/noticias/arquitetura/a-sustentabilidade-e-historia-da-arquitetura-vernacular-africana
https://quatrocantosdomundo.wordpress.com/2015/06/21/grande-mesquita-de-djenne-mali-arquitetura-espetacular/
https://www.archdaily.com.br/br/1012691/explorando-as-cabanas-vernaculares-africanas-tecelagem-como-arquitetura-social-e-bioclimatica
https://www.istockphoto.com/br/foto/mali-%C3%A1frica-vila-dogon-e-pr%C3%A9dios-t%C3%ADpicos-de-lama-gm626046284-110410895
https://www.uol.com.br/ecoa/ultimas-noticias/2023/10/24/como-este-povo-africano-conseguiu-fugir-dos-portugueses-durante-escravidao.htm
https://hardecor.com.br/arquitetura-primitiva-africana-linda/
https://www.historiadasartes.com/igrejas-de-pedra-da-etiopia/
https://www.matematicaefacil.com.br/2022/07/reino-zimbabue-grande-zimbabue.html
https://blog.abreutur.com.br/tag/egito-antigo/
https://novidario.com.br/cultura-e-informacao/arquiteto-urkinabe-francis-kere-vence-o-premio-pritzker-2022/
https://arquitetura.vivadecora.com.br/david-adjaye/
https://www.phaidon.com/agenda/architecture/articles/2019/september/30/architecture-by-women-mariam-kamara/
https://edition.cnn.com/style/article/mphethi-morojele-south-african-architect































